Um dos donos da boate Kiss, que pegou fogo no domingo (27) em Santa Maria (RS) e deixou ao menos 231 mortos, afirmou, em depoimento à Polícia Civil, que sabia que o alvará de funcionamento estava vencido, mas que já havia pedido a renovação. Elissandro Calegaro Sphor também culpou a banda Gurizada Fandangueira pelo início do incêndio, segundo o delegado Sandro Meinerz.
Sphor, conhecido como Kiko, compareceu espontaneamente à sede da 1ª Delegacia da cidade no domingo (27) para dar sua versão dos fatos. Ele foi preso nesta segunda (28) após ter a prisão temporária decretada. Além dele, dois integrantes do grupo musical também foram presos. Um outro dono da boate é considerado foragido. O advogado de Sphor, Jader Marques, disse que “é importante que não se faça um juízo antecipado de condenação de ódio, de raiva, despejando sobre a pessoa toda a incompreensão, todo o peso da tragédia”.
De acordo com o delegado, Sphor contradisse a versão dos músicos, de que um curto-cirtuito provocou o fogo, e responsabilizou o grupo. O dono da boate Kiss também negou tenha ordenado aos seguranças que impedissem a saída dos jovens da festa na hora que o fogo começou. Sphor, que estava na boate quando a tragédia ocorreu, negou ainda ter retirado do local o computador que armazenava as imagens gravadas pelas câmeras de segurança da boate. O gravador sumiu do local, segundo Meinerz, responsável pelo caso.
“Ele estava na festa na hora que o incêndio começou e, inclusive, diz que ajudou a socorrer alguns dos clientes e que deixou o local de carona com medo de ser agredido por clientes depois do fato. Inclusive o carro dele ficou guardado no estacionamento de um mercado em frente. Ele negou que tivesse mandado os seguranças fecharem a boate para impedir que alguém saísse sem pagar. Diz que isso não ocorreu”, afirmou o delegado.
Sphor disse que o fogo teve início após a banda Gurizada Fandangueira usar um sinalizador no palco para fazer efeitos. A versão dele contradiz o depoimento de quatro integrantes do grupo musical já ouvidos pela Polícia Civil. Os músicos disseram que houve um curto-circuito em fios que estavam no teto do palco após o equipamento conhecido como “sputnik” ser utilizado. Segundo eles, o grupo já tocava uma outra música quando o fogo teve início.
O auxiliar de palco responsável por fazer os efeitos, em sua defesa, também disse que o fogo não foi provocado pelo sinalizador, conforme o delegado. A banda disse que o modelo usado na apresentação não tinha capacidade de provocar incêndio.
Peritos acharam no chão da boate pedaços do sinalizador, que será recolhido nesta segunda-feira (28). Sphor confirmou à polícia que sabia que a Kiss estava com a licença de funcionamento vencida desde agosto de 2012, mas que, em outubro, havia pedido a renovação do alvará ao Corpo de Bombeiros. Na época, os bombeiros fizeram uma série de exigências e recomendações para que o local pudesse voltar a funcionar plenamente. A polícia ainda apura quais aspectos os donos da boate já haviam cumprido e como estava o processo de renovação.
Segundo o delegado, um dos fatos que ainda não foi esclarecido diz respeito às imagens das câmeras de segurança. Ele disse que não foram localizados na boate os gravadores que armazenam as imagens da boate. “Parecia que os fios tinham sido arrancados. Não sabemos afirmar se foi recente ou não. Peritos ainda irão analisar”, disse Meinerz.
Em sua defesa, Sphor afirmou que o sistema não estava funcionando havia três meses e que, por isso, o computador não estava mais na boate. Policiais civis cumpriram na noite de domingo mandados de busca e apreensão na casa de Sphor e de outro sócio da boate, Mauro Hoffmann, mas não localizaram nada. A Kiss está no nome da mãe e da irmã de Sphor, segundo o delegado, mas os verdadeiros sócios são Elissando Sphor e Mauro Hoffman.
Advogado do dono da boate
“É muito importante que a comunidade tenha essa noção. As pessoas precisam ter em mente que durante muitos anos essa casa foi de diversão dos amigos do Kiko. Lá que eles comemoraram muitas datas, foi um ambiente bom para todo mundo até a tragédia”, afirmou o advogado de Sphor, Jader Marques. “Por recomendação médica ele se submeteu a um tratamento de observação, desintoxicação”, disse Marques. “Ele atuou incansavelmente nas atividades e inalou muita fumaça. Teve de ser internado para receber tratamento.” A prisão ocorreu em um hospital de Cruz Alta. Segundo o advogado, Sphor estava na boate “recebendo, atendendo, e com a esposa grávida”. “Ele perdeu funcionários.”
Guitarrista da banda
O guitarrista da banda Gurizada Fandangueira, Rodrigo Lemos Martins, negou a culpa pelo ocorrido. Ele disse acreditar que faltou sinalização da boate para a saída de emergência. “Queremos justiça. Não temos culpa de nada. Não queríamos perder um companheiro”, afirmou, sobre a morte do sanfoneiro Danilo Jaques.
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