Joaquim Melo, criador do banco Palmas
“Se eu pudesse apontar um momento, daqueles em que você diz: ‘Agora não tem mais jeito, minha vida vai ser essa’, foram aqueles oito meses em que morei com os catadores de lixo, em Fortaleza (CE), convivendo com os urubus, com o lixo, com a lama. Tudo ali é um contexto só. É o fundo do poço da miséria humana. Ali eu disse, não tem mais jeito, daqui pra frente minha vida inteira vai ser enfrentando esse flagelo da humanidade que é a pobreza, a miséria”.
O depoimento é de Joaquim Melo, fundador do Banco Palmas – se não o primeiro, um dos primeiros bancos sociais do Brasil – em cena do documentário Quem se Importa, que estreia nesta semana, dia 13, em São Paulo, e 20, no Rio de Janeiro. Em 1984, o então seminarista Melo foi morar no lixão para fazer trabalhos comunitários. A maioria dos catadores do lixão residia na favela Palmeiras, a maior de Fortaleza. Melo, então, se mudou para o lugar. Com o passar dos anos, depois de muitos mutirões comunitários, a favela virou bairro, com saneamento básico, água encanada e luz.
Sem condições de bancar essa nova estrutura, pagar conta de água e luz, os moradores do Palmeiras passaram a vender suas casas e deixar o bairro. Foi assim que nasceu a ideia do Banco Palmas. Por meio de uma pesquisa, o “Mapa da produção e do consumo local”, a comunidade percebeu que gastava R$ 1,2 milhão em compras mensais. Cerca de 25 mil pessoas moravam no conjunto à época. Basicamente, 80% do que consumiam vinha de fora do bairro. A conclusão: se o dinheiro ficasse dentro do bairro, as pessoas também teriam condições de permanecer ali.
Sem condições de bancar essa nova estrutura, pagar conta de água e luz, os moradores do Palmeiras passaram a vender suas casas e deixar o bairro. Foi assim que nasceu a ideia do Banco Palmas. Por meio de uma pesquisa, o “Mapa da produção e do consumo local”, a comunidade percebeu que gastava R$ 1,2 milhão em compras mensais. Cerca de 25 mil pessoas moravam no conjunto à época. Basicamente, 80% do que consumiam vinha de fora do bairro. A conclusão: se o dinheiro ficasse dentro do bairro, as pessoas também teriam condições de permanecer ali.
A largada foi dada com um empréstimo de R$ 2 mil, em 1998. O crédito era fornecido à população local por meio de uma moeda própria, a “palmas”, utilizada e aceita apenas na própria comunidade. O sistema que passou a funcionar é o mesmo até hoje. Cada palma vale R$ 1 na transação. Nenhum comerciante é obrigado a aceitar, mas cerca de 240 estabelecimentos aceitam a moeda local no Conjunto Palmeiras. O morador pode fazer um empréstimo sem juros em palmas. Ele pode ainda trocar reais por palmas no próprio banco e consumir com descontos de 5 a 10% nos estabelecimentos credenciados. Outra possibilidade, ainda, é receber parte do salário na moeda própria.
Logo, as pessoas começaram a pagar o crédito e o Banco Palmas foi conseguindo mais injeção de capital. O dinheiro passou a circular. De 2007 a 2009, o banco realizou 3.139 operações de crédito, com um volume emprestado de R$ 4.126.712,79. No total, 2,5 mil famílias foram beneficiadas pelo esquema. Segundo cálculos da organização, 8 mil postos de trabalho foram mantidos e mais 2 mil foram gerados.
Uma pesquisa da Universidade Federal do Ceará (UFCE) avaliou o impacto do Banco Palmas sobre a comunidade e mostrou que 90% dos entrevistados melhoraram sua condição de vida, 25% conseguiram um emprego e 23% montaram um pequeno negócio. O comércio local aumentou suas vendas em 80%. Ao todo foram criados 2,2 mil postos de trabalho e seis empresas comunitárias. A experiência do Palmas começou a se disseminar no Brasil. Existem, atualmente, 67 bancos comunitários no país. Em 2006, foi criada a Rede Brasileira de Bancos Comunitários, que integra todos os bancos. “A palma não foi criada em Harvard ou na USP. Surgiu nos grotões do Nordeste”, diz Melo no filme. “A pobreza não é uma sentença.”
Aluguel de banheiros
Outra história contada pelo documentário é a do nigeriano Isaac Durojaiye. Durojaiye, que morreu no último dia 20, trabalhou como guarda-costas de Moshood Kashimawo Olawale Abiola, ex-presidente nigeriano, empresário e político. Ao notar que a falta de banheiros limpos era responsável por muitas doenças que acometiam sua comunidade, Durojaiye montou uma rede de toaletes públicos, a DMT Mobile Toillets.
Para gerenciar os banheiros, a DMT contratou “meliantes de rua ociosos”, como chefes de ganges, prostitutas etc. Cada banheiro normalmente serve cerca de 100 pessoas por dia e seus “gerentes” ficam com uma parte do dinheiro. Eles levam 60% da renda e e repassam 40% para a DMT. Por meio da parceria, os integrantes não apenas ganham salários decentes, como também adquirem a experiência de trabalho significativa e podem ser reintegrados à sociedade.
A ousadia nos negócios da DMT vai adiante. Como em qualquer negócio, Durojaiye sabia que o aluguel de banheiros públicos precisava de um forte slogan para ser divulgado. Foi assim que surgiu o “Shit Business is Seriuous Business” (em livre tradução, algo como “A merda é um negócio sério”). “Ideias são coisas que devemos libertar. Quanto mais você guarda sua ideia para si mesmo, mais ela se torna inútil”, afirma o empreendedor nigeriano no documentário.
Crédito pela internet
A imagem nunca saiu da cabeça do indiano Premal Shah. Aos cinco anos, Shah foi a um mercado com sua mãe. Era a época das monções, o período das chuvas na Índia e o chão estava repleto de lama. Quando sua mãe deixou cair uma moeda de uma rúpia, uma senhora de 60 anos imediatamente se abaixou e ficou remexendo a lama na tentativa de encontrar algo.
Em 2006, com uma vida muito tranquila, ele começou a ficar inquieto. “Eu tinha bons amigos, um bom emprego, bom salário, mas sentia que faltava algo”, conta ele em Quem se importa. Dessa inquietação nasceu a Kiva, uma organizaçao sem fins lucrativos que conecta pessoas ao redor do mundo que precisam de empréstimos para abrir um negócio a possíveis financiadores. O empréstimo começa em US$ 25 (o equivalente a quase R$ 46). Em seis anos, a Kiva já emprestou US$ 300 milhões e registra uma taxa de 98,94% de pagamento. Pela iniciativa, em 2009, Shah foi selecionado pela revista Fortune para a lista dos maiores empreendedores abaixo dos 40 anos e eleito Jovem Líder Global pelo Fórum Econômico Mundial.
Banqueiro dos pobresSegundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o terceiro setor movimenta aproximadamente R$ 32 bilhões no país. O valor representa 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Quem se Importa é um documentário de Mara Mourão, com narração do ator Rodrigo Santoro. O filme mostra ainda a experiência de Muhammad Yunus, fundador do Grameen Bank e ganhador do Nobel da Paz, Bill Drayton, fundador da Ashoka, primeira organização do mundo a identificar e apoiar o empreendedorismo social.
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